sábado, 6 de março de 2010

Capítulo Primeiro

Eram três horas da manhã, ela olhava pela janela. Nada de novo, nada de diferente. Estranhamente ela sentia como se tudo estivesse realmente diferente ou fora do lugar. Olhou de novo o relógio, não tinha passado nem um minuto, mas era como se tivesse tempo o suficiente para ter passado sua vida inteira pela memória.
Diante daquele “nem um minuto” simplesmente sentou-se, olhou para a porta, não chegou a pensar, agiu por pura impulsividade. Foi. Com ela não levava nada, além de suas chaves. Estava frio, mas nem um casaco ela pensou em pegar, simplesmente saiu. Não agüentava mais olhar para aquela casa vazia, não queria mais ficar sem nada para fazer. Como diria Vinícius de Moraes: “Ai que tédio enorme da vida”.
Começou a andar e reparar na sua rua, coisa que nunca havia feito antes, pelo simples fato cotidiano de sair apressada e atropelando a própria pressa. Passava sempre por uma doceria, mas nunca reparou quão bonita e confortável ela parecia ser ou como a praça estava diferente desde o primeiro olhar dado a ela naquela tarde em que o corretor entregara as chaves do apartamento.
A vida havia mudado muito, porém ela sabia que se algo mais poderia ser feito, esse algo era apenas dentro de si. Precisava ter paciência com seu jeito, com suas auto-críticas. Olhar-se no espelho já não era a mesma coisa de antes. Não aparentava mais a juventude de antes, nem sorria simpaticamente como antes. Tudo o que ela tinha era a boa memória da vida que levava, dos sorrisos dados a estranhos, sem motivo algum; das ocasiões declaradas, agora, como ‘pouco aproveitadas’. Mas sempre se consolava com a crença de que só passamos a dar o devido valor quando vem algo mais difícil e torna aquele pequeno problema em algo sem significado.
Na sua caminhada “noturna” acabou por perceber um homem observando-a. Ele olhava fixamente, ela não entendia o motivo, chegou a ter medo, mas continuou seus passos sem alteração alguma. Ele estava parado, apoiado num poste de luz e fumando um cigarro. O efeito dado pela luz, fez com que ela comparasse aquela cena a um ‘filme policial das antigas’.

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